Ser ou não ser sazonal? Eis a questão…
Beber cerveja é um hábito milenar. E depois de anos de evolução de estilos e hábitos de consumo, há estilos e gostos para tudo. Há quem goste das cervejas mais claras, há quem goste das escuras, e há quem goste das ruivas. Mas e os que gostam de coisas diferentes consoante as estações do ano? Esse sou eu! 🙋♂️ O beber cerveja, ao meu ver, é muito afetado pelo ambiente e as estações do ano. E mesmo se dentro de um bar ou recinto a temperatura esteja por volta dos 20ºC, o dia em si induz muito o meu hábito cervejeiro. Estou vivendo no Norte da Grécia, e em pleno Novembro já tivemos temperaturas abaixo dos 5ºC. Talvez aqui eu até prefira um bom vinho tinto, felizmente também há bebidas para todas as ocasiões. Mas, com um horizonte temporal de 3 meses para o meu primeiro exame do BJCP, não posso deixar os estudos de cerveja para depois. Porém, posso escolher por explorar os estilos mais "inverneiros" antes de aumentar a temperatura da casa para os 30ºC haha. Olhando para a classificação dos estilos por história que estou seguindo encontramos categorias como "Bock", "English Mild", "Dark American Beer", "Porter", "Irish Stout", "English Stout", "Strong Ale", "Barleywine" e todo o arsenal Belga ("Belgian Ale" e "Belgian Strong Ale") que podem trazer um certo aconchego nesse tempo gélido. Algumas cervejas trazem o próprio aquecimento alcoólico, outras uma seleção de grãos mais tostados e um corpo mais cheio que acaba por atrair mais o meu gosto durante esse período.
E no fundo é isso, o outono geralmente já começa a me trazer desejos de uma cerveja mais encorpada e escura. Os dias mais curtos, quando chega aquele final de dia que apetece uma cervejinha para relaxar já está anoitecendo, e assim o meu paladar também pede algo diferente. Sei que muitas pessoas não vivem em zonas temperadas, e não vão entender essa perspectiva. Ao passo que outras já estão no Outono desde Setembro. Mas o próprio mercado vai criando tendências e iniciativas que nos incentivam a explorar esses estilos. Temos as "Pumpkin Ale" (sim, uma cerveja com abóbora 🎃) na época de Halloween, depois as "XMAS edition" (seria uma abreviação de Christmas, ou seja, as edições de Natal). E como o mundo tem dois hemisférios, no Brasil uma edição de Natal semelhante a do hemisfério Norte não vai fazer grande sucesso. Provavelmente aqui o termo "Winter Ale" (Ale de inverno) faça mais sentido, e o BJCP até tem uma categoria para elas ("Winter Seasonal Beer", cerveja sazonal de inverno). São esses estilos que evocam a utilização de especiarias como cravo, canela, noz moscada e também sabores e aromas de frutos secos e casca de citrinos, produtos muito utilizados nas festas de fim de ano. No hemisfério Norte então, as famílias se reúnem, os amigos todos voltam às suas terras e o convívio pede uma cerveja que também aqueça um pouco o coração. Porém, essa é uma tendência mais recente, uma vez que as escolas alemãs e britânicas são muito tradicionais e não adicionam ingredientes diferentes às suas cervejas. Porém, a escola belga tem uma longa tradição de utilização de frutas e especiarias e produção de cervejas específicas para o final do ano. Ontem mesmo bebi uma Chimay Grand Réserve, e quando fiz o check-in no aplicativo (Untappd, estou devendo um post sobre ele), li que foi feita pela primeira vez como uma cerveja de Natal em 1956 (imagem meramente ilustrativa abaixo). A escola americana também abraçou essa causa, especialmente pelo apelo comercial que a época festiva tem nos Estados Unidos.
E como referi, são dois hemisférios, e já sou experiente em passar o final do ano festivo em qualquer um deles (6 no Hemisfério Norte e 30 no Hemisfério Sul 😂). No Sul, o calor impera e aqui é melhor uma cerveja leve, bem gelada/fresca para matar a sede. Mas, a evolução dos estilos nos brindou (literalmente 🍻) com as "India Pale Ales" mais modernas, ou IPAs para os mais íntimos. Bombas cítricas e refrescantes que muitas vezes nem dão a perceber o alto teor alcoólico, o que pode realmente ser perigoso no verão. Não esqueçam da água para não desidratar! Além das IPAs, temos claro cervejas como as "Pilsners", as "American Lagers" e as "International Pale Lager" que já fazem sucesso em qualquer estação, mas que para o meu paladar são melhores no verão. Um estilo que cresceu muito, e que também me agrada nessa época, são as "Sours". São cervejas que aceitam muito bem a utilização de frutas e assim podem ser muito refrescantes, perfeito para um dia solástico de verão. Como na Europa ainda temos horário de verão, quando o dia termina e o sol ainda vai alto, esses estilos mencionados são os meus preferidos para matar a sede.
Porém, como eu disse no início, a prova para ser Juiz do BJCP irá acontecer em Março, e a temperatura não vai subir assim tanto até lá. Dessa forma vou ter que domar o meu gosto sazonal e acabar por fazer o sacrifício de estudar cervejas mais refrescantes em pleno inverno (Oh vida dura 😂). E a temperatura tem tudo a ver com a experiência sensorial da cerveja. Não só quando literalmente avaliamos uma amostra, e nesse caso deveria estar mais próxima da temperatura ambiente (perto dos 20ºC), mas sempre que bebemos uma cerveja. A temperatura pode arruinar ou dignificar a experiência. Se vocês se permitirem experimentar, vão ver que encontramos muito mais facilmente aromas e sabores em uma temperatura mais próxima da ambiente (não vale muito a pena com cervejas com sabores subtis). Mas como nem sempre estamos avaliando, cada cerveja também tem uma indicação de temperatura para serviço, e isso depende do estilo. No outro dia, fui em um dos bares aqui que gaba ter um menu com mais de 100 cervejas. Realmente, a diversidade era grande. Como já fazia um friozinho, pedi uma "Stout" de uma marca local, uma vez que não havia nenhuma "Stout" nas torneiras. Para a minha surpresa e das minhas papilas gustativas estava muito gelada/fresca. Depois reparei na(o) geladeira/frigorífico atrás do balcão onde estavam a maior parte das cervejas, o mostrador marcava -4ºC. Podemos ter em conta que é um bar ainda bastante frequentado, e por isso, a porta deve ser aberta com muita frequência, o que justificaria uma configuração de temperatura mais baixa, mas -4ºC é realmente excessivo. Especialmente quando já estamos no outono. Fato é que a minha experiencia ficou completamente prejudicada, pois as papilas gustativas sentem nada mais que o frio do líquido, e todos os aromas e sabores ficam escondidos. Claro, podemos esperar ela equilibrar um pouco com a temperatura ambiente, mas ninguém pede uma cerveja para ficar olhando para ela.
Os mesmos -4ºC talvez seriam propícios para servir uma Budweiser, uma Brahma ou uma Super Bock em um dia quente de verão. Tudo depende, mas aquela "Stout" servida na temperatura indicada (7 a 12ºC) teria com certeza outro sabor. E claro, um bar que queira vender mais de 100 rótulos diferentes também deveria investir em geladeiras/frigoríficos com temperaturas distintas de funcionamento consoantes os estilos que estão armazenados. #ficadica Sendo assim, ser sazonal ainda agrega mais esse desafio, encontrar bares que realmente entendem o produto que tem em mãos e trabalhem para entregar esse valor no copo do cliente. Ou parar de reclamar e beber em casa hahaha A temperatura de consumo também acaba por ser uma questão cultural (daria um belo outro post💡), e como a massificação do consumo de estilos diferentes de cerveja é recente, temos que dar tempo ao tempo! Ou abrir o nosso próprio bar? Não era mal pensado… enquanto isso não acontece, deixo vocês com essa imagem maravilhosa das estações do ano feita com a ajuda do menino gpt haha até a próxima!🍻