Estilos do BJCP classificados por história: Wheat Beer - Witbier & American Wheat Beer

Olá. Hoje trago a última avaliação de cervejas da categoria "Wheat Beer" dos estilos do BJCP classificados por história. A avaliação por si será de uma Witbier, mas também vou falar sobre o estilo "American Wheat Beer". Vou ter que apenas "falar" porque não encontrei nenhum exemplo comercial desse estilo por aqui, embora já o tenha bebido. Junto com as "Weissbier" que já avaliamos, esses dois estilos restantes ("Witbier" e "American Wheat Beer") são os mais populares da categoria. É quase como se tivéssemos interpretações diferentes da utilização do trigo para diferentes escolas cervejeiras. Enquanto as "Weissbier" representam a escola alemã, as "Witbier" representam a escola belga. Por último, e muito por influência dos imigrantes alemães nos Estados Unidos, temos as "American Wheat Beer" que são praticamente um adaptação da "Weissbier" aos ingredientes e a escola americana. Logo, enquanto as "Weissbier" e as "Witbier" já tem alguns anos de evolução em termos de estilo, as "American Wheat Beer" ainda são bem recentes. Mas vamos lá começar pelas "Witbier".

As "Witbier" são um estilo com uma certa história, e que por um detalhe não caíram no esquecimento. Comigo foi quase a mesma coisa. A primeira vez que bebi não fiquei impressionado e não voltei a beber tão cedo. Porém, alguns anos mais tarde, depois de já estar me aventurando nas produções cervejeiras, um amigo pediu que fizesse uma receita clone de uma "Witbier". Fiz uma pesquisa sobre as receitas disponíveis na internet e percebi que seria a primeira vez que iria utilizar ingredientes incomuns na cerveja que não água, malte, lúpulo e levedura. Isso me deixou intrigado, mas decidi fazer uma pequena litragem para satisfazer o gosto do amigo. Fiquei positivamente impressionado com o resultado, e passei a ver esse estilo com outros olhos. E vamos ter que dar nome aos bois porque tanto no renascimento histórico das "Witbier" como no caso do pedido do meu amigo, esse rótulo aparece, e é sem dúvida o expoente desse estilo. Estamos falando da cerveja "Hoegaarden". 

Em se tratando de história, acredita-se que esse estilo seja produzido desde a Idade Média na região dos Flanders, na Bélgica. Porém, desde início do século XX, quando as Lagers leves e claras começaram a fazer furor, esse estilo também enfrentou uma queda de popularidade que quase levou a sua extinção. Em 1950, a última cervejaria que produzia "Witbier” na cidade de Hoegaarden fechou. Um anjo apareceu, chamado Pierre Celis, e resolveu fundar uma nova cervejaria e fazer renascer das cinzas a nossa querida Fênix "Witbier". Ele decidiu por dar o nome da cidade a cerveja, e assim temos a famosa cerveja "Hoegaarden". O curioso é que o anjo Pierre era um leiteiro, mas havia trabalhado na cervejaria que fechou na sua juventude. Ele recriou a receita baseado no que se lembrava e com a ajuda de alguns moradores locais que ou conheciam a receita, ou os sabores da clássica "Witbier". Salve Pierre e os habitantes de Hoegaarden!

E no fundo "Witbier" quer dizer cerveja branca no dialeto Flamengo falado na Bélgica, assim como "Weissbier" quer dizer cerveja branca em alemão. Ô povo sem criatividade!😂Diferentemente dos alemães que eram mais puristas na utilização dos ingredientes, os belgas utilizavam não só cereais não maltados (trigo e aveia) mas também especiarias para produzir a sua cerveja branca. O resultado é uma cerveja amarelo palha para dourado, mas relativamente turva e com um colarinho branco muito cremoso. As especiarias utilizadas são as sementes de coentro e maioritariamente casca de laranja (mas há receitas com casca de limão) que ressaltam o caráter frutado e condimentado da levedura e trazem um frescor sem igual. É realmente espetacular de ser apreciado em um dia quente de verão. O que me impressionou quando produzi a minha primeira "Witbier" foi abrir manualmente as sementes de coentro e sentir aquele aroma, e depois conseguir encontrar o mesmo aroma em perfeita harmonia na hora de degustar a cerveja. Foi realmente "mindblowing"! (Desculpem, a tradução seria alucinante, mas não é isso, é mesmo de explodir com os miolos da gente e o que a gente pensa que sabe da vida).

Estou me divertindo muito com essa história, mas temos que focar na cerveja. Claro, que para essa avaliação eu usei a cerveja "Hoegaarden". No aroma, percebemos logo o caráter condimentado da levedura em intensidade média potencializado pelo aroma das sementes de coentro. Ainda, aparecem notas cítricas de casca de laranja/tangerina e o aroma doce de cereais e massa de pão característico do trigo em segundo plano. O guia de estilo descreve um perfume de limão e coentros com um complexo componente herbal, condimentado ou apimentado. Também descreve o aroma maltado de pão e um leve aroma de cereal e condimentado aromático do trigo. Por fim, diz que as especiarias devem se combinar com os aromas frutados, florais ou doces e não se sobrepor a eles. Assim, essa amostra apresentava grande assertividade no estilo, onde a levedura sobressai com o caráter condimentado e cítrico, e as adições de especiarias complementam e potencializam ainda mais esse perfil. A aparência da cerveja é de um amarelo palha turvo com um colarinho branco de bolhas pequenas, muito cremoso. O colarinho é médio e com retenção longa. Todos esse parâmetros estão de acordo com o descrito no guia de estilos (me desculpem, a foto está péssima haha).

No sabor, o frutado cítrico predomina lembrando limão e casca de laranja de intensidade média. Em segundo plano também aparece o condimentado da levedura com as sementes de coentro. O dulçor lembra mel e até um pouco banana, mas todos esses sabores aparecem em grande equilíbrio. O final é médio e refrescante. Na sensação de boca, o trigo ajuda a trazer um corpo médio. A carbonatação é alta e trás uma pequena formigação na língua agradável e contribuindo para o frescor. A impressão geral dessa amostra é espetacular. Uma cerveja que trás alguma complexidade de sabor frutado e condimentado mas muito equilbrada, refrescante e fácil de beber. Os habitantes de Hoegaarden tem realmente que estarem orgulhosos. E a nós cabe agradecer por não terem deixado esse estilo morrer.

Por fim, vamos dedicar os últimos parágrafos as "American Wheat Beer". Esse estilo foi criado como uma adaptação americana a "Weissbier". Se bem lembram, a lei alemã estabelece a utilização de pelo menos 50% de malte de trigo na cerveja para ser considerada uma "Weissbier". Porém, os americanos dificilmente usam tanto malte de trigo, a proporção ficaria algo próximo dos 30-40%, e uma grande alteração é também a levedura utilizada. A "Weissbier"alemã usa uma levedura Ale, e tem o componente característico dos ésteres de banana e o fenólico de cravo/cravinho. Os americanos com seu gosto por cervejas mais limpas em perfil de fermentação, utilizam uma levedura Lager que contribui pouquíssimo para o perfil sensorial. Por outro lado, os americanos também carregam um pouco mais na quantidade de lúpulo, dando assim uma interpretação muito diferente a cerveja de trigo, com maior aroma e amargor de lúpulo.

Assim, o aroma das "American Wheat Beer" costuma ter uma intensidade baixa a moderada de malte com notas de pão e cereal e geralmente um perfil neutro de fermentação. Porém, um aroma baixo a moderado de lúpulo é característico nesse estilo podendo ter caráter cítrico, condimentado, floral ou frutado. Mas, banana ou cravo/cravinho são completamente inaceitáveis aqui. Na aparência, elas são do amarelo para o dourado. Enquanto as "Weissbier" são maioritariamente turvas pela combinação da levedura e do malte de trigo, algumas "American Wheat Beer" podem ser bem claras ou então turvas. O colarinho deve ser alto e com longa retenção. Na boca, a descrição semelhante ao aroma, como dulçor do malte se apresentando de baixo a moderado. Porém, o amargor e o sabor do lúpulo podem ser de baixo a moderado trazendo novamente notas cítricas, condimentadas, florais ou frutadas. O equilíbrio pode ser mais maltado ou com um final mais seco. Na sensação de boca, o corpo pode ser médio-baixo para médio. A carbonatação média-alta para alta e essas cervejas podem apresentar uma sensação de maciez ou cremosidade, mas que segundo o BJCP é opcional. 

Portanto, a impressão geral de beber uma "American Wheat Beer" é mais leve e refrescante quando comparada com uma "Weissbier". Isso tudo graças a a essa incorporação do caráter do lúpulo, um menor contributo da levedura para o perfil sensorial da cerveja e uma percentagem menor de malte de trigo na receita. Essas cervejas tem uma boa popularidade no mercado americano e acabaram por já ter interpretações em diversas geografias o que justificou a classificação delas como um estilo a parte. Assim, encerramos o estudo da categoria "Wheat Beer" dos estilos do BJCP classificados por história. Isso quer dizer que temos que começar uma nova categoria, qual será? Fiquem ligados que logo vocês saberão! Saúde!🍻      

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